quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Zeitgeist 2010

A vida parece ser feita em etapas, e em cada uma delas nos aproximamos de pessoas diferentes (ou nos afastamos delas). 2010 foi desses anos onde pude pensar um pouco mais sobre minha relação com as pessoas e o motivo de escolher tê-las por perto.
Nesse ano poderia ter havia uma das melhores safras de amigos, pois conheci talvez uma dezena de pessoas fantásticas, que me instigaram a querer continuar a conhecê-las, e que a cada uma das novas conversas sempre se mostravam mais encantadoras.
Mas ao contrário das previsões, esse não foi um ano repleto de amigos, diria até que foi o mais escasso deles, desde sempre. E para os amigos de quem me afastei, para os amigos que se afastaram, para os que decidiram se afastar e para aqueles que eu gostaria de ter me tornado amigo, apenas enviei uma mensagem curta de bom natal, a qual recebi respostas carinhosas.
Esse ano foi outro regado por emoções fortes. Algumas enriquecedoras, mas para a maioria digo que preferiria ter passado sem as conhecer. Das enriquecedoras, uma foi ter visitado um lar de idosos no natal. Alguns dos velhinhos me pareceram amargurados com a vida, e todos solitários, inclusive da companhia uns dos outros. Estar lá, fazendo o possível para amenizar a dor de alguns, fez ver na velhice deles a minha velhice. Assim como já vejo na solidão madura da maioria de meus professores, o meu próprio futuro.
Sei que a vida é o que escolhemos para ela, e que nada ainda se impõe como definitivo. Mas os jogadores já começam a definir suas posições, e estou inseguro de ter feito, e estar fazendo, as melhores escolhas. Mas seja a escolha que for, sempre cuidarei daqueles que me importam.
2010 vai tendo sido apenas melhor que 2009. E já vai tarde.

domingo, 19 de dezembro de 2010

Sobre a maturidade

Por Alyne Costa

Aprendo o quanto amadurecer pode nos proporcionar um enriquecimento de vida. Vida, assim, dividida, sempre nova, fértil, plena, encantadora, mas na qual não podemos apagar as cicatrizes da alma. As marcas das experiências ficam, nos constroem. Antes eu julgava que o coração criava crostas e íamos nos tornando mais resistentes às emoções: mortes não nos causavam tanto assombro, decepções não nos levavam ao chão, as perplexidades diminuíam e a aventura de estar vivo parecia cada vez menos excitante. É claro que amadurecer nos torna fortes e isto não tem nada com a quantidade de anos vividos. Amadurecer tem muitas faces. Amadurecemos muito com os sofrimentos, as perdas, a distância, a saudade, os diversos “pra sempre” e “nunca mais”, mas amadurecemos também com experiências únicas de encontros na vida. Amadurecer não significa perder o encanto pelas coisas que vivenciamos, antes saboreá-los com menos pressa e mais ternura. Amadurecer não significa perder a vibração e a magia perante o novo, mas vibrarmos numa outra faixa, com mais responsabilidade pelos nossos sentimentos e pelos alheios. Amadurecer é a incrível descoberta de um eu profundo e paradoxalmente jovem, novo, sedento de releituras. Isso porque o nosso olhar muda. Passamos a ver a vida sob uma ótica mais amena, menos rigorosa, mais terna e mais valorizadora dos pequenos encantos do cotidiano, antes quase imperceptíveis. O amadurecimento pode nos vestir sob diferentes aspectos: filhos, lutos, rompimentos, crises e descobertas. Toda gama de relações e fatos que nos circundam acenam para essa evolução do eu que assim, se descobre, se desnuda, transmuta e cresce. Mas este crescer não tem sentido se é um crescer solitário e silente. Amadurecer/Crescer significa também ramificar e se abrir, expor ao mundo, ao vizinho, ao amigo, ao colega de trabalho a riqueza de nossas experiências. Isso é saber amadurecer junto, trocando, cedendo, doando parte de sua alma ao mundo, que como cada um de nós também amadurece. Mas o mundo é outra história e a história é cíclica... Porém, jamais igual. Amadurecer não é virar Mamãe e Papai, Vovô e Vovó... Não é repetir atos, padrões, certezas e regras. Amadurecer é se descobrir: limites e potencialidades. É querer continuar bebendo no pote da vida, mas perder (ganhar) um pouco mais de tempo apreciando o sabor. Amadurecer é estar aberto sempre, é ter menos “pé atrás”, é aprender a depositar confiança nas pessoas, pois estas são seres humanos e não ciladas. É ir ao encontro do outro menos desarmado já que a vida urge e não viemos ao mundo apenas para guerrear, precisamos também de doçura e de paz. Amadurecer significa ver encanto nas coisas mais ínfimas, mas que mais nos tocam a alma e nos transformam como seres humanos. Amadurecer é não só aprender com os erros a não repeti-los, mas, sobretudo perceber que errar é inerente à natureza humana e, assim, devemos ser mais flexíveis com os que erram conosco. Amadurecer é muito mais que esta maravilhosa descoberta do “eu”... Amadurecer é a deliciosa descoberta do “outro”... E como um dia afirmou Drummond: “Aprendi novas formas de amar e tornei outras mais belas”. Talvez amadurecer seja exatamente a afirmação da necessidade de descobrirmos, inventarmos, pela nossa sobrevivência, novas formas de Amar.

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Grafite inverso

Alexandre Orion, equipado com retalhos de tecido se dedicou a uma tarefa incomum durante várias madrugadas. Ele limpou a fuligem dos carros que impregnava as paredes do túnel túnel Max Feffer em São Paulo, e cobriu-as com o desenho de caveiras. Essa intervenção deu origem a exposição "Ossário", que esteve no Centro Cultural Banco do Brasil entre março e maio de 2010.

Em entrevista Orion disse que "A polícia podia ser agressiva ou educada, mas a conclusão foi sempre a mesma. Como não havia crime, ela ia embora. A única maneira de impedir a intervenção era lavar o túnel, e assim foi."



Novos Desenhos de Julian Beever nas calçadas





quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Quem somos eu.

Autor: Ricardo Reis

Vivem em nós inúmeros;
Se penso ou sinto, ignoro
Quem é que pensa ou sente.
Sou somente o lugar
Onde se sente ou pensa.
Tenho mais almas que uma.
Há mais eus do que eu mesmo.
Existo todavia
Indiferente a todos.
Faço-os calar: eu falo.
Os impulsos cruzados
Do que sinto ou não sinto
Disputam em quem sou.
Ignoro-os. Nada ditam
A quem me sei: eu 'screvo.

domingo, 17 de outubro de 2010

Da geração 81 sob o signo de aquário

Autoria: Beatriz Provasi
Eu vivo uma geração sem expoentes
Uma geração de estrelas cadentes que sequer se sustentaram no céu para dar-nos suas quedas em espetáculo celestial
Uma geração de trevas ofuscada pelas luzes eletrificadas que explodem retinas
A minha geração ficou no meio do caminho entre a que foi e a que talvez virá – virá?
Nem sexo, drogas e rock’n roll nem açaí com guaraná
Uma geração big mac, fast food, self service, coca diet com entrega a domicílio que cresceu na frente da TV
Eu não sei da internet o tanto que ela sabe de mim nem li tantos livros assim
Vivo entre o passado e o futuro a semente estéril de uma geração imprensada em cima do muro
E eu aqui deslocada sem estourar numa ploc, sem entender nada de rock, achando que a minha vida é um pit stop
Onde é que isso tudo vai parar?
Sei lá, acho que a minha geração perdeu a hora, saca? Tava dormindo e não ouviu o despertador tocar. Acordou meio-dia no meio da vida na casa dos pais achando que viver ou morrer tanto faz.
É uma geração que não dá poema. Não rima nem arrebata. Não ladra nem morde. Jamais daria um uivo. E nem consegue arrancar suspiros ou suspender respirações.
Sendo fruto de uma geração que não representa nada, nem a minha própria geração eu sou capaz de representar.
Eu vivo na contramão de uma geração que não tem fluxo pra lugar algum.
Então, como é que eu posso dar em algum lugar?
Não, meu bem, eu não quero acordar. Me deixe dormir até meio-dia no meio da vida na casa dos pais achando que viver ou morrer tanto faz. Eu desliguei o despertador, então, faça o favor, não me acorde, meu bem. A minha geração dorme de olhos abertos, mas eu, meu bem, eu só quero sonhar. Me deixe sonhar que nesse meio do caminho eu ao menos sou pedra, e não terra pisada como o resto da estrada.

terça-feira, 28 de setembro de 2010

Fotos diárias (com disciplina) e stop motion

Nesse post relaciono alguns vídeos com que cruzei no Youtube e que se tornaram conhecidos pelo empenho que exigiram e pelo incrível resultado visual que alcançaram.
Os três primeiros são sequências de fotografias diárias que objetivam ressaltar as modificações no corpo que o tempo impõe.
O último deles é um vídeo em stop motion que tem em comum com os anteriores apenas ser um trabalho de fotografia e o grande número de acessos. Também está aqui pela trilha sonora bem animadinha que adota.
Por fim, gostaria de colocar aqui um criativo clip da música Her Morning Elegance, do cantor, músico e diretor teatral Oren Lavie, que também utiliza recursos de stop motion... mas isso já seria um grande desvio do propósito deste post (mas, se quiser, podes clicar no link que leva à música).
São todos vídeos pops, mas como nunca dá para estar antenado em tudo que acontece na rede, coloco-os em destaque aqui.


Sequência de fotos que mostram a barriga da mamãe crescendo ao longo dos nove meses.





Noah Kalina começou a fotografar-se todos os dias em janeiro de 2000, e continua até hoje
Acredito que esse seja o mais conhecido dentre os vídeos com essa mesma proposta, provavelmente devido aos cuidados na pós-produção (por exemplo, com o enquadramento) aliados ao fato se serem apresentados mais de seis anos, ou 2356 dias/fotos. 
É engraçado ver como seu cabelo nunca está igual por dois dias consecutivos, e chocante ver que dez anos a mais podem nos deixar acabadões (como o vídeo "só" vai até 2006, tem que licar no link de "continua até hoje" para ver como ele está). 
Depois desse trabalho surgiram projetos como o Daily Mugshot, que incentiva desocupados pessoas a seguirem os passos de Noah.





Jonathan Keller tem aqui fotografias entre 1998 e 2006, o que torna esse projeto ainda mais antigo que o de Noah, embora, aparentemente, tenha sido divulgado depois. A música (que eu prefiro deixar no mudo) vem num ritmo muito diferente da de Noah, que Jonathan caracteriza como sendo muito sentimental.





Esse aqui é pequenino, "apenas" 200 dias/ fotos. Mas já dá para perceber que ela se produz muito mais que os rapazes.





Mike atravessa os EUA, desde New York, até São Francisco, num projeto de stop motion muito meticuloso, para dizer o mínimo! O diferencial aqui é que cada uma das mais de 2700 fotos foi cuidadosamente planejada, de modo a dar uma percepção de continuidade, desde o andar do modelo, até a posição do Sol. Acredito que quem conhece esses pontos tem muito mais a apreciar (e recordar) que eu, que simplesmente adorei. A propósito, a música se chama Home, de Edward Sharpe and the Magnetic Zero.






quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Quão surpreendente! (poema)


Quão surpreendente foi sonhar
sem dormir,
E perceber que o Sol já coloria as paredes
nos primeiros minutos do dia.

Divagávamos por anedotas da nossa história,
num esforço consciente por nos conhecer.
Queríamos ser íntimos, partilhar nossos
medos, prazeres e recordar melhores momentos.
Queríamos construir novos,
de novo.
Numa história que reciclasse
o que não foi,
para sermos um com o outro.

Dormimos LADOaLADO,
e mesmo estado o real encortinado,
sinto como se nos tenhamos acariciado,
encaixados dentre abraços,
num instinto de zelo
pelos laços que se formavam.

Acordamos e dividimos o pão.
Dei meu queijo, ganhei uma goiabada,
e do pacote de cream-cracker (não comido)
surgiram científicas especulações micro-econômicas
da natureza da bolacha.

Quis ver jatos, marinheiros,
aeronautas e soldados.
E no caminho foi a procurar por
pérgulas, brise-soleils e cobogós
que nos divertimos
... quando o trajeto importa mais
que o destino.

Devassa. Varnhagen. Sub-way. Arteplex...
O "onde" e "o que" já não importavam tanto,
meu "com quem" já era bom o
suficiente.

(Foi intenso) Minha cura.
(Foi rápido) Minha pró-cura.
(Foi verdadeiro) Minha procura.

Desintoxicado, partilhei novamente momentos
com o melhor de mim mesmo,
e tornou-se mais nítido contemplar o nascer
de um "eu" encantado,
Renovado,
Melhorado.